Collectis
As
coisas não iam muito bem nesta noite, a mulher olhava
ininterruptamente pelo pequeno vitral do templo, a luz da lua
continuava iluminando o pátio parcialmente escuro da pequena igreja
e ela podia ver toda a movimentação do lado de fora através dos
vidros coloridos, asas negras batendo, o brilho das lâminas que
reluziam à luz do luar, gritos de dor e de ódio misturando-se o
tempo todo ao som do atrito das espadas...
Colocara
as mãos sobre os ouvidos para tentar amenizar um pouco do barulho
que a estava enlouquecendo e movimentara a cabeça para a direita e
para a esquerda em movimentos contínuos, mas... Era inútil... O
barulho continuara a atormentando e cada vez mais alto...
Começara
a notar que uma das paredes começara a trincar lentamente,
acompanhada de um barulho quase ensurdecedor, era como se uma grande
bola de demolição colidisse com a parede com uma força absurda,
assustada sentara-se na outra extremidade da pequena igreja. Após
alguns instantes notara que a parede apresentava uma grande
rachadura, uma enorme mão atravessara a parede e começara a forçar
a pequena abertura... Os tijolos que formavam a cúpula da igreja
começaram a ceder gradualmente e o que era apenas um trincado
começara a ganhar proporções de um enorme buraco na parede, as
pinturas sacras começaram a ganhar vida e a movimentar-se nos
grandes afrescos da cúpula, um forte cheiro de queimado começara a
inebriar que sentia seu estômago revirando-se e a bile chegando à
sua boca.
Abaixou
a sua cabeça e deixou com que o vômito eclodisse, levantara a
cabeça novamente e vira um demônio gigantesco entrando pela cúpula
da igreja, suas enormes asas negras ainda desprendiam-se da abertura
feita na parede. Olhou em volta e notara que os desenhos haviam se
transformado em homens magros e sujos, formando um enorme cone
parecido com a ilustração que Dante fizera dos sete infernos em sua
maior obra, porém o demônio que ficara no sétimo havia destruído
a parede e agora caminhava em sua direção...
“Senhor
do céu, me proteja... Ave Maria, cheia de graça...” Uma oração
começara a sair aos prantos, mas o demônio de pele queimada e asas
parecidas com as asas de um morcego ainda caminhava em sua direção,
a espada dourada e suja de sangue ainda fresco em riste... A oração
fora substituída por gritos de horror...
Ψ
A
enfermeira entrou no quarto e ficara ligeiramente irritada, como a
paciente havia se soltado novamente das contenções? Colocou a
bandeja com as medicações de horário na mesa de cabeceira e tocara
a campainha para pedir ajuda, a mulher de meia idade estava sentada
em um dos cantos do quarto sob uma enorme poça de vômito, suas mãos
estavam espalhadas sobre os ouvidos e ela gritava alucinadamente...
Colocaram-na
na cama e a contiveram novamente, a enfermeira administrara a
medicação endovenosa e esperara com que uma sedação leve fizesse
efeito, saíra do quarto novamente e após três horas retornara ao
quarto para ver o estado da paciente que permanecia em silêncio, a
cena que encontrara fora impressionante...
O
cadáver permanecia contido no leito, as marcas de queimado envolviam
seu pescoço, como se houvesse sido enforcada por uma corda em
chamas, por suas vias aéreas vazava um líquido viscoso e a rigidez
cadavérica não deixara com que seus braços se movessem, era como
se estivesse morta há muito tempo...
AllisonRdS